Reis Friede - A Segunda Guerra Mundial sob o Ponto de Vista de Hitler



A história humana tem muitas leituras e, consequentemente, as mais variadas interpretações. Entretanto, como princípio geral, apenas é conhecida a versão dosvitoriosos ou, no mínimo, a daqueles que possuem uma maior (e efetiva) capacidade de divulgação (e difusão).

A Segunda Guerra Mundial, - na qualidade de maior acontecimento histórico de todos os tempos (e que selou uma radical mudança no curso da vida cidadã, e das nações, inspirando novos destinos à humanidade) -, não é nem poderia ser exceção à regra.

Por esta razão, a importância acadêmica de ser plenamente conhecido e entendido o ponto de vista de HITLER, sobre aqueles eventos e, particularmente seu consistentediscurso (nos anos que antecederam a guerra), afirmando que a Alemanha estava sendo insultada (continuamente) por ameaças de destruição, de invasão e de guerra, além de suas constantes reclamações de desmantelamento (unilateral) do exército alemão.

Suas afirmações, conjuntamente com alguns fatos pré-guerra, alertavam que as potências vencedoras da Primeira Guerra Mundial estavam planejando a mudança (definitiva) da fronteira alemã do Rio Oder para o Rio Elba (304 km para dentro do território alemão) e que a nação alemã apenas estava assistindo pacientemente essas agitações provocativas, causadas, particularmente, pela França e pelo Reino Unido, e que, ainda segundo o discurso de HITLER, supostamente parafraseando CHAMBERLAIN, “os Aliados precisavam dessa guerra, que fosse longa, de pelo menos três anos, e não propriamente de paz”.

Ainda como parte do seu discurso, HITLER afirmava, com recorrência, que em suas mais diversas investidas para negociação de paz, foi sempre categoricamente ignorado e verbalmente insultado perante os holofotes do mundo inteiro. Alegando ainda que CHAMBERLAIN, a partir do início das hostilidades, na Polônia, se recusava a discutir propostas de paz e que de Londres apenas se escutava um clamor uníssono: o que a guerra, a partir daquele momento, deveria seguir em frente, mesmo que isso custasse à destruição do Reino Unido.

O FÜHER, segundo os documentos alemães da época, prosseguia em seu discurso deixando claro que jamais foi seu propósito fazer guerra, e sim, construir uma nova nação nacional-socialista de elevada cultura, e que cada ano desse conflito o desviava desse trabalho, na qualidade de seu derradeiro objetivo finalístico.

É importante lembrar que seis anos antes do começo da Segunda Guerra Mundial, os nacionais-socialistas ascendiam ao poder na Alemanha, após o colapso da República de WEIMAR, que, em seus momentos finais, estava marcada pela crise e pela fome que assolava a população. SEBASTIAN HAFFNER, jornalista e historiador alemão, descreve que a atmosfera, durante a posse dos integrantes do novo Partido, refletia uma espécie de sentimento comum e generalizado de salvação e libertação da democracia.



Com o intuito de reviver a economia alemã, os nacionais-socialistas instituíram planos de metas quadrienais. Nesse momento, HERMANN GÖRING ficou responsável pela idealização e implementação dos planos econômicos e programas de trabalhos. Para os seus partidários, era de fundamental importância a melhoria da saúde e bem-estar da classe média, por meio da implementação de um amplo programa de apoio governamental.

Neste sentido, foi criado o Serviço Nacional de Trabalho, instituição que buscava combater o desemprego em massa, no qual se encontrava atrelada àquela sociedade. O órgão oferecia treinamento qualificado aos jovens e criava projetos de trabalho, visando supostamente o bem comum. Somente no campo da agricultura, foram milhares de horas trabalhadas por alemães, fosse cuidando de árvores, drenando pântanos e até construindo rodovias.

O plano de trabalho teve um êxito indiscutível e, consequentemente, um efeito econômico e social impactantes. Ao contrário do que muito se acredita, a indústria de armamentos não teve (inicialmente) o papel protagonístico que tanto se alardeia na recuperação alemã. Na verdade, as principais indústrias responsáveis pelo crescimento econômico germânico produziam bens e serviços para empresas privadas e, sobretudo, para o consumo doméstico.

No que diz respeito a política externa, os objetivos de HITLER eram inicialmente humildes e reservados. No entanto, o reconhecido descaso (em sua percepção) para com sua abordagem mais conservadora o fez mudar de tática. Na região do Sarre, que pelo Tratado de Versalhes, pertenceria ao longo de 15 anos, à nação francesa, foi de sua iniciativa promover um plebiscito, no qual a própria população local escolheria entre ficar com os franceses, se tornarem neutros ou se reunificar aos alemães. O resultado da consulta foi a reunificação ao Reich, com mais de 90% dos votos.

Nos anos de 1921 e 1923, França e Bélgica se aproveitaram da desmilitarização alemã no Reno, para ocupar a região do Vale do Ruhr (rica em carvão mineral). Em 1925, a Alemanha assinou o Pacto de Locarno, concordando em manter seu compromisso com a desmilitarização na área da fronteira oeste. Essa medida lhe assegurou um assento na Liga das Nações. Em troca, França, Bélgica e Alemanha, acordaram não mais reclamar territórios uma das outras.
Soldados franceses e um civil durante a ocupação do Ruhr.
No entanto, dez anos após a assinatura do acordo, a França, sob a ótica alemã, passou a violar seus termos, assinando um Tratado de Cooperação Mútua com a URSS, recém incorporada à Liga das Nações (em 1934). A partir dessa iniciativa, HITLER não se viu mais obrigado a respeitar o Pacto de Locarno, enviando então, em março de 1936, suas tropas para o território alemão do Reno. Mesmo sendo desaconselhado por seus líderes militares e pelos principais responsáveis pelas relações exteriores germânicas, - por conta de uma possível reação militar francesa -, HITLER decidiu seguir seu curso de ação na região do Reno, acreditando que a resposta de Paris seria tímida e meramente retórica.

Vale lembrar que, o Tratado de Versalhes, - abrangendo inicialmente todos os seus signatários -, propunha a redução bélico-militar de todos os países envolvidos, (e não apenas da nação germânica), ainda que seu processo fosse (objetivamente) iniciado pelo Estado alemão, que, de fato, cumpriu com o tratado, chegando a não possuir Força Aérea e mantendo um efetivo ativo de apenas 15.000 homens na Força Naval e 100.000 nas Forças Terrestres.

No entanto, França e Reino Unido, segundo a ótica de HITLER, seguiram na contramão do tratado, assegurando investimentos na modernização de suas tropas. Posteriormente, em Genebra (1937), HITLER sugestionou a limitação de certas categorias de armas, como bombardeios e armas pesadas para todos os Estados membros da Liga das Nações, incluindo a URSS recém ingressada em 1934. Porém, como suas propostas não foram concretizadas, o então líder do Reich, sentiu-se completamente livre das restrições gerais impostas pelo acordo e começou a reconstruir suas Forças Armadas.

O próximo passo da política externa de HITLER foi buscar a reanexação da Áustria ao Reich (lembrando que este país antes da Primeira Guerra Mundial, era parte integrante da Alemanha e mais de dois terços de seu povo era alemão),ainda que, com um histórico de diversas tentativas (anteriores) frustradas, conduzidas por agentes externos, que permitiu que a Áustria seguisse separada da Alemanha até o ano de 1938, quando, durante um regime ditatorial, foi votado um plebiscito (supostamente manipulado) com o propósito de se decidir (ou não) pela reanexação alemã.
 Anschluss - A anexação da Áustria pela Alemanha em Março de 1938
O então Secretário de Estado Alemão GÖRING, que assim como HITLER, nasceu na Áustria, assistia inquieto a uma (pouco disfarçada) manipulação de votos, ocorrida durante o plebiscito, e ameaçou o envio de tropas para a capital austríaca, fazendo assim com que SCHUSCHNIGG, então ditador austríaco renunciasse.

No dia seguinte, as tropas alemãs tomavam as ruas do país austríaco e eram recebidas com grande jubilo pela população (o que foi amplamente documentando em filmes da época). Tendo, logo em seguida, as tropas austríacas, em reciprocidade, desfilado em território alemão, como uma demonstração de anexação pacífica (e duplamente desejada), afastando qualquer versão de conquista territorial, tendo sido esta firmada oficialmente em abril de 1939,através de um referendo onde 99,73% da população votou pela reanexação do País à Alemanha.

Posteriormente, por questões étnico-culturais de minorias legislando sobre o destino da população germânica dos Sudetos Alemães, território integrante da Tchecoslováquia, -e por estes estarem se sentindo oprimidos (e desconsiderados em seus direitos de relativa autonomia) -, os mesmo solicitaram oficialmente sua anexação ao Reich Alemão.

A resposta de Praga foi instituir leis marciais sobre os Sudetos, o que fez com que HITLER fosse obrigado, em resposta, a exigir a imediata anexação dos territórios. Em reunião com os chefes de estados britânicos, franceses, italianos e alemães, todos concordaram pelo retorno dos mencionados territórios para a Alemanha. Sendo assim, mais de três milhões de alemães, e o território dos Sudetos, retornaram ao Reich.

No entanto, o episódio dos Sudetos abriu espaço para que outros territórios, pelos mais diversos motivos, também reivindicassem sua reanexação. Os alemães do território de Memel (constituído pelo Tratado de Versalhes, e, por mandato da Liga das Nações, de controle francês mas que, todavia, foi anexada pela Lituânia, em 1920) também demandaram seu retorno ao Reich.

O governo da Lituânia tentou apoio da França e do Reino Unido, reclamando a jurisdição do território. No entanto, ambas as partes preferiram não se envolver. Com isso, o governo lituânio aceitou a proposta alemã e, em 1939, retornaram o Memel ao Reich.

Varsóvia então sentiu-se alienada, uma vez que poderia ocorrer o mesmo no Estado livre de Danzig, cidade marcada por ser uma importante zona portuária, que mesmo estando profundamente integrada com a estrutura política polonesa, encontrava-se sob controle da Liga das Nações. Na sombra das anexações, a Polônia então, ameaçou publicamente incorporar o Estado de Danzig por completo (e definitivamente) inúmeras vezes. O medo de perda era compreensível, posto que dos 370.000 habitantes da cidade, 97% eram alemães.

O governo alemão, em resposta, reclamou a anexação de Danzig ao Reich, o que acabou sendoo primeiro dos três motivos que levaram à guerra entre poloneses e alemães. O segundo motivo seria a área da Prússia Oriental, que foi dada à Polônia pelo Tratado de Versalhes, território onde dois terços da população eram declaradamente devotos ao governo alemão, e que, por pertencer ao domínio polonês, cortavam a ligação alemã com a Prússia Ocidental.

A ligação entre esses dois países se dava apenas por trajeto ferroviário, para o transporte de minérios. Com a crise econômica alemã, o governo polonês viu a possibilidade de implantar um estrangulamento econômico sobre a Alemanha, abrindo e fechando, à sua conveniência, as ferrovias, com a justificativa de que o governo alemão não estaria pagando as tarifas de forma correta.

Nesse momento, a Alemanha fez nascer o (inovador) conceito político-jurídico deautoestrada extraterritorial, e concebeu uma ferrovia que atravessaria a Prússia Ocidental até a Prússia Oriental, assim reunificando (na prática) Danzig ao Reich. Como forma de transformar essa ideia em uma realidade efetiva, começaram as negociações entre Berlim e Varsóvia, que, em grande medida, envolviam ganhos significativos para ambos os lados.

No entanto, as concessões oferecidas pela Alemanha não pareceram suficientemente atrativas para a Polônia, considerando que, em fevereiro de 1939, o Estado-Maior Geral Polonês estabeleceu as diretrizes para uma operação militar contra a Alemanha.

No contexto deste novo cenário, percebendo um clima de animosidade entre ambas as potências; França e Reino Unido formalmente garantiram pleno apoio militar à Varsóvia, na hipótese de eclodir um conflito. O Chefe de Estado francês, general GAMELAIN, assegurou ao Ministro de Guerra polonês, general KASPRZYCKI, que em caso de guerra, o exército francês atacaria a fronteira oeste alemã. Esse ato acabou conferindo à Polônia um caráter menos negociador com Berlim, posto que aquela nação passou a se sentir (político e militarmente) protegida em caso de conflito.

As tensões, entretanto, começaram a aumentar na Polônia: lojas alemães eram boicotadas, alemães eram agredidos, e mapas com a fronteira polonesa chegando próxima a Berlim começaram a rodar pelo país. Nesse contexto, alemães étnicos se tornaram refugiados e, ao tentar passar pelas fronteiras polonesas, eram simplesmente alvejados. Em Danzig e no Reich Alemão, pouco antes do começo da guerra, mais de 80.000 alemães se encontravam em campos de refugiados.

HITLER em contato com as administrações francesas e britânicas deixou claro que as questões entre Alemanha e Polônia não podiam mais tardar, sendo urgente uma solução definitiva, na medida em queo problema das minorias alemãs na Polônia já estava ofuscando a questão de Danzig, passando, neste momento, a ser uma questão mais ampla, pavimentando, desta feita, o caminho que deu origem ao terceiro motivo que levaria ao começo da Segunda Guerra Mundial.

Analisando todos os aspectos envolvidos, HITLER percebeu que a única forma viável, para prosternar as tensões que circundavam aquele momento, seria a guerra. Sendo assim, no verão de 1939,o FÜHRER não hesitou em despachar 52 divisões de seu exército para uma invasão militar ao território polonês fronteiriço.
Tropas alemãs a caminho  da Polônia, são saudadas por Adolf Hitler (Setembro de 1939)
A União Soviética, que ostentava objetivos próprios, - de futura implantação de hegemonia global ideológica (comunista) -, ainda não se encontrava preparada para um planejado enfrentamento com as potências ocidentais (notadamente o Reino Unido e a França) e mesmo com a própria Alemanha.

Ainda que sob a tutela administrativa de STALIN, o poderio militar de Moscou tivesse crescido exponencialmente (no que diz respeito a armamentos e tecnologia),chegando, em seu auge, a ter mais tanques do que todas as potências europeias juntas, os expurgos stalinistas de seus líderes militares, ainda não recomendavam (ou mesmo permitiam) uma aventura militar com reconhecidas chances de êxito.

Nesse contexto, HITLER buscou uma aliança político-militar (de dupla conveniência)com a URSS, antes de atacar a Polônia, presumindo que um pacto com a Rússia dissuadiria o Reino Unido e a França de atacarem a Alemanha.

Sob a ótica de STALIN, esse seria o ponto crítico; ou seja, a guerra entre blocos (ocidentais antagônicos) na Europa, prevista por LÊNIN. A URSS esperava que França, Alemanha e o Reino Unido entrassem em um conflito de longa duração até ficarem exaustos, ocasião em que seria o momento em que STALIN agiria estrategicamente.
Ciente das (veladas) intenções soviéticas, - e derrubando a expectativa geral do que seria uma invasão militar alemã no dia 26 de agosto, como já havia sido acordado,- HITLER tentou, mais uma vez, um acordo pacífico com a Polônia, buscando o apoio do Reino Unido, como mediador para com o governo polonês.

Os britânicos, por sua vez, se esquivaram de interferir, atrasando HITLER em seus planos, ao mesmo tempo em que incentivando Varsóvia a manter sua posição firme contra a Alemanha. Após inúmeras e fracassadas negociações, HITLER, finalmente, deu a ordem para o Wehrmacht invadir a Polônia¹.


Encontro de oficiais Soviéticos e alemães após a invasão Soviética da Polónia.

1. A Concepção Hitleriana de Ocupação dos Territórios Soviéticos na Segunda Guerra Mundial

Curioso observar que as lições que HITLER extraiu dos desastrosos resultados da Primeira Guerra Mundial (ou seja, a reorganização política de territórios, mantidas, entretanto, suas respectivas populações étnicas), fizeram com que ele aplicasse, na Segunda Guerra Mundial, uma forma (inovadora) de expansão territorial para o Leste, simplesmente dizimando as populações locais e as substituindo por alemães, impedindo, em seu ponto de vista, que após o término daquele conflito, novas reivindicações de reanexações territoriais pudessem ser procedidas contra o suposto vencedor alemão naquele conflito, evitando replicar os supostos erros cometidos pelos termos dos tratados do pós-Primeira Guerra Mundial, notadamente o Tratado de Versalhes.

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