A Turquia e o temor de um Estado curdo







Avanços territoriais dos curdos no norte da Síria acendem alerta em Ancara e são principal motivo para a operação militar turca no país vizinho.

 

 

Milícia curda do YPG celebra a expulsão do EI de Kobane, em 2015. Curdos já conquistaram quase todo o norte da Síria
Oficialmente, a operação Escudo de Eufrates, executada pela Turquia no norte da Síria, volta-se contra o grupo extremista “Estado Islâmico” (EI), mas o alvo central é outro: os militantes curdos sírios.
Porque, mais do que a formação de um “Estado Islâmico”, nos moldes do que pretende o EI, o que a liderança turca de fato teme é o surgimento de um Estado ou região autônoma curda. Na Síria, essa já tem até nome: Rojava, ou Curdistão Ocidental. Seus pilares são três regiões administrativas, em torno das cidades de Afrin (extremo oeste), Kobane (centro) e Qamishli (no extremo leste).
A consolidação de uma região autônoma curda dentro do território sírio daria novo ânimo às aspirações separatistas dos curdos que vivem no território turco. Essas aspirações são representadas pelo PKK, grupo que se insurgiu em prol da independência curda e hoje luta por mais autonomia dentro da Turquia.
As milícias curdas do YPG (o equivalente sírio do PKK) já conquistaram quase todo o território no norte da Síria, na região de fronteira com a Turquia. A região dominada por elas se estende do extremo leste até o rio Eufrates, além de um enclave em torno de Afrin, no extremo oeste.
Há duas semanas, os curdos sírios avançaram para o lado ocidental do Eufrates com a conquista da cidade de Manbij, até então controlada pelo “Estado Islâmico”. Isso indica que eles poderiam ampliar seu domínio até o extremo oeste da faixa de território no norte da Síria – essa possibilidade foi a senha para a operação Escudo de Eufrates.
O objetivo da Turquia é evitar que os curdos sírios conquistem mais território e expulsá-los de Manjib, uma cidade de população predominantemente árabe. Para isso, a Turquia apoia rebeldes do Exército Livre da Síria. A situação daí resultante é confusa: a Turquia, que é aliada dos Estados Unidos na Otan, apoia o Exército Livre da Síria contra o YPG, que, por sua vez, é apoiado pelos Estados Unidos, que também apoiam o Exército Livre da Síria.
Como se isso não bastasse, a Turquia se aproximou da Rússia, que apoia o regime do presidente sírio, Bashar al-Assad, contra o qual tanto o Exército Livre da Síria quanto o YPG lutam, ambos com o apoio dos Estados Unidos.
Os curdos são um grupo étnico espalhado por quatro países: Turquia, Irã, Iraque e Síria. A região por eles habitada, e que abrange áreas desses quatro países, é historicamente chamada de Curdistão. Unir as quatro partes numa nação é um anseio antigo de grupos nacionalistas curdos, como o PKK e o YPG. Com a guerra civil na Síria e no Iraque – onde os curdos iraquianos já governam de forma autônoma uma região no norte do país – o objetivo de uma nação curda nunca esteve tão próximo de se tornar realidade.

 

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