O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, nunca tentou esconder suas intenções. Ainda em setembro, ele apresentou na sede das Nações Unidas, em Nova York, um mapa com um largo corredor delineado na fronteira síria, então sob controle turco.
Talvez uma iniciativa decidida e conjunta de seus parceiros na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) tivesse demovido o autocrata do Bósforo de sua aventura militar. Mas, como se sabe, não foi o que aconteceu: o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, liberou o caminho e, no início de outubro, teve início a operação militar turca no norte da Síria, disfarçada de missão antiterrorismo e sob o cínico nome "Fonte da Paz".
O que aconteceu, desde então: segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), as tropas turcas e as milícias jihadistas suas aliadas forçaram 200 mil habitantes da Síria setentrional a fugir. Vídeos nas mídias sociais aparentemente mostram uma execução em massa de combatentes e políticos curdos capturados.
Até mesmo para o secretário de Defesa americano, Mark Esper, "parece" tratar-se de crimes de guerra. Os curdos procuram ajuda contra a ofensiva turca junto ao líder sírio, Bashar al-Assad, e seus aliados russos. E centenas, talvez milhares de adeptos do grupo terrorista "Estado Islâmico" (EI) escapam de um campo curdo durante uma fuga em massa. A "operação antiterror" turca contra as milícias curdas na Síria provoca um retrocesso considerável no real combate ao terrorismo, a luta contra o EI.
Enquanto califado do terror com território próprio, ele de fato foi abatido, à custa de grandes sacrifícios dos mesmos combatentes curdos que agora têm que se defender dos ataques de Erdogan. No entanto, quando há cerca de um ano caiu seu último bastião, Baghouz, o "Estado Islâmico" continuou vivendo como organização terrorista oculta, com militantes na Síria e Iraque e com ramificações do Afeganistão à Nigéria.
O então secretário de Defesa americano, James Mattis, se demitiu em dezembro último em protesto, em meio à disputa quanto à periculosidade de um EI territorialmente derrotado. Foi quando Trump anunciou pela primeira vez a intenção de retirar suas tropas da Síria.
Mattis estava convencido de que uma retirada americana prepararia o solo para o retorno dos jihadistas. Também Brett McGurk, enviado especial de Washington para a luta contra o EI, apresentou sua demissão.
Embora o perigo de uma invasão pela Turquia estivesse sempre pairando sobre os territórios curdos no norte da Síria, preferiu-se deixar as coisas correrem. Agora é de se prever que extremistas altamente perigosos vão se libertar e, por conta própria e incógnitos, pôr-se a caminho da Alemanha. Com todas as consequências concebíveis.
A União Europeia se deixou chantagear por Erdogan, com sua ameaça de deixar 3,5 milhões de refugiados sírios seguirem adiante. Mas ignorou a ameaça de dezenas de milhares de seguidores do EI que possivelmente estarão à solta.
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