BR-VE - Em visita à Venezuela MD negocia fornecimento de energia a Roraima e recebe pedido de ajuda



General Joaquim Silva e Luna se encontrou com o ministro da Defesa venezuelano em Puerto Ordáz, em agenda sigilosa

BRASÍLIA - Em viagem secreta à cidade venezuelana de Puerto Ordaz, o ministro brasileiro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna, pediu ao ministro venezuelano da Defesa, general Vladimir Padrino, a continuidade do fornecimento de energia elétrica a Roraima e escutou do representante do país vizinho um pedido de ajuda diante da crise humanitária que já expulsou milhões de migrantes.

Os dois ministros se encontraram ontem em Puerto Ordáz, numa agenda mantida em segredo até a realização do encontro. Em entrevista ao GLOBO, Luna disse que procurou "esconder" a viagem como estratégia de reaproximação entre Brasil e Venezuela, rompidos diplomaticamente desde dezembro do ano passado.

– Eu procurei esconder. Foi estratégia minha, mesmo. Eu não sabia como ia ser essa recepção. As relações diplomáticas com a Venezuela estão rompidas. Nosso embaixador foi expulso. Estamos há dez meses sem ter contato com a Venezuela. É o primeiro representante do governo que vai ao país desde o rompimento – afirmou o ministro da Defesa.



O governo de Nicolás Maduro nunca reconheceu a legitimidade do governo de Michel Temer. Maduro considera que o impeachment da presidente Dilma Rousseff foi um golpe orquestrado por Temer. No fim de dezembro, Caracas anunciou que o embaixador brasileiro no país era "persona non grata", o que significava uma expulsão. Em resposta, o governo brasileiro decidiu, três dias depois, declarar como "persona non grata" o principal diplomata venezuelano no país, o encarregado de negócios da Venezuela em Brasília. Ele também foi expulso.

A crise migratória, com milhares de venezuelanos entrando no Brasil por Roraima, inclusive com cenas explícitas de xenofobia na fronteira, obrigou os dois países a estabelecerem um mínimo de diálogo. Além disso, uma questão energética atravessou o caminho: a Venezuela ameaçou cortar o fornecimento de energia para Roraima, único estado que não está ligado ao sistema energético nacional. O governo brasileiro não paga uma parcela de US$ 33 milhões, prevista em um contrato que vigora desde 2001 entre a Eletronorte e a venezuelana Corpoelec. A gestão Temer alega que o pagamento não é feito em razão do embargo econômico vigente na Venezuela, que impede um depósito em dólar.

Os registros oficiais do encontro entre os dois generais mostram um clima festivo e de amizade. Segundo o ministro brasileiro, o primeiro convite do ministro venezuelano foi feito em maio, quando ocorriam as eleições no país, em que Maduro foi reeleito. Luna disse não ter achado "conveniente" o momento, deixando a visita para este segundo convite. Temer avalizou a ida à Venezuela, segundo o ministro, que vai se encontrar nesta quarta-feira com o presidente e com o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, para tratar do assunto.



– Ele (general Padrino) ofereceu que fosse em Caracas ou em Puerto Ordaz, que é no meio do caminho. Eu preferi Puerto Ordaz, pois evitaria exposição midiática lá. A recepção foi muito calorosa. Parecia um velho amigo que não encontrava há muito tempo. Nunca tinha tido contato com ele – afirmou Luna.
Garantia de fornecimento de energia

O ministro da Defesa diz ter ouvido de seu par venezuelano que não haverá corte na energia fornecida a Roraima:

– O presidente Temer havia pedido para tratar com ele sobre o assunto da energia elétrica, que nos interessava. Eles garantiram que não vai ter corte nenhum. Eles sabem que não conseguimos fazer o pagamento por conta do embargo econômico. Até brincou: "Não vai ter corte de energia e nunca vai ter corte nas nossas relações. Não é por causa disso que a Venezuela vai interromper o fornecimento de energia".

Ainda conforme o general brasileiro, o ministro venezuelano reconheceu a verdadeira "diáspora" decorrente da crise econômica no país e se mostrou aberto a ajuda dos países vizinhos:

– Eles precisam de ajuda. O país está passando fome. A diáspora deles tem a ver com embargo econômico que foi colocado lá dentro. "Eu quero trazer o meu pessoal de volta, não tenho meios de fazer", me disse. Eu perguntei: "Você aceita ajuda?" Ele aceita tudo.

O ministro da Defesa venezuelano relatou que o governo Maduro tenta colocar em prática um programa, "De Volta à Pátria", para trazer de volta os emigrantes que deixaram o país. Segundo o ministro brasileiro, os relatos e pedidos de ajuda serão levados ao Itamaraty.

– Ele disse que não há histórico de saída de migrantes para o Brasil por causa da dificuldade das fronteiras. Isso aconteceu por problema econômico, mesmo. Ele não tem dinheiro para alimentar o povo dele, e admite que estão saindo por fome. Ele cita o embargo econômico. Não há condições econômicas para segurar o pessoal lá. Não há emprego, não há trabalho – disse Luna.

O general brasileiro afirmou ainda que decidiu ir sozinho, sem integrantes do Itamaraty, em razão do rompimento das relações diplomáticas. Segundo ele, as relações entre militares estão mantidas, com adidos das Forças Armadas em cada país.

– Ele pediu ajuda para que ajudemos junto a outros países, para mediar essa conversa. Eu disse que isso é o Ministério das Relações Exteriores que tem de tratar disso. A ideia da viagem foi mais de fazer uma expedição exploratória, entender o ambiente. Mas mantive contato com o Itamaraty todo o tempo.

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