Projeto aprovado pelo Senado tira da estatal a obrigação de ser operadora única do pré-sal, com pelo menos 30% de participação em cada consórcio. Iniciativa pode ter consequências negativas e positivas para o país.
Os senadores aprovaram na noite de
quarta-feira (24/02) o fim da participação mínima obrigatória da
Petrobras de 30% nos consórcios de exploração do petróleo da camada
pré-sal.
Na prática, o projeto – que ainda será
avaliado pela Câmara dos Deputados e enviado à sanção da presidente
Dilma Rousseff – retira a obrigação de a estatal ser operadora e
investidora em todos os blocos. E abre caminho para que petroleiras
estrangeiras participem sozinhas dos próximos leilões.
A proposta é controversa. Seus defensores
argumentam que o fim da obrigatoriedade pode aliviar o caixa da estatal
e destravar o setor. Os detratores, por outro lado, dizem que a
Petrobras não sobrevive sem o pré-sal e alegam ser arriscado mudar a
legislação no momento em que o petróleo está em baixa.
Alívio financeiro
Os defensores do projeto dizem que a
estatal não tem condições financeiras de participar de todas as
licitações, já que a empresa tem uma dívida bruta de mais de 500 bilhões
de reais e está com a imagem arranhada junto a investidores devido às
consequências da operação Lava Jato.
A situação da Petrobras era diferente em
2010, quando a atual legislação sobre a participação mínima de 30% na
exploração dos campos foi aprovada. Segundo analistas, os novos leilões
de blocos de pré-sal do governo federal estariam sendo postergados por
conta das restrições financeiras da estatal – o que é negado pelo
governo federal. A exigência faz com que o país afaste investimentos
internacionais na área.
"A mudança do marco regulatório é um
avanço, porque viabiliza a retomada dos investimentos pela Petrobras,
que, com o modelo atual, não teria geração de caixa para participar de
todos os investimentos previstos em seu plano", diz Gilberto Braga,
professor de finanças do Ibmec/RJ. "Sem a obrigatoriedade de
participação, o governo deverá acelerar os leilões de blocos do pré-sal
de forma seletiva, mesmo com o barril a cerca de 30 dólares."
Maior flexibilidade
O projeto aprovado pelos senadores dá uma
flexibilidade maior à estatal. Um substitutivo sugerido pelo senador
Romero Jucá (PMDB-RR) feito à proposta do senador José Serra (PSDB-SP)
faz com que o Conselho Nacional de Política Energética ofereça à estatal
a exploração mínima de 30% em cada campo. Assim, a empresa poderá
manifestar se aceita ou não a responsabilidade.
Assim, a Petrobras terá a opção de
escolher os leilões em que deseja participar, aliviando seu caixa e
destravando o setor. "Ninguém está entregando nada. Ninguém está levando
nada embora. Tudo continua nas mãos do poder público, apenas a
Petrobras não é obrigada a investir. Apenas isso. Se ela quiser, em um
mês, ela manifesta sua intenção e controlará o poço", afirma Serra.
Riscos ao interesse nacional
Detratores afirmam que o projeto favorece
as empresas multinacionais e pode acabar entregando as riquezas
nacionais às grandes petroleiras. Para eles, a mudança da legislação é
um retrocesso e, num momento de alta volatilidade no preço do petróleo,
não é propícia.
Outro argumento é de que o atual modelo
de partilha foi colocado em prática somente uma vez, no leilão do
megacampo Libra, o primeiro do pré-sal e maior licitação da história do
Brasil, realizado em outubro de 2013. O único consórcio que apresentou
proposta – formado pela Petrobras (40%), pela anglo-holandesa Shell
(20%), pela francesa Total (20%) e pelas chinesas CNPC (10%) e CNOOC
(10%) – ganhou o direito de explorar a área por 35 anos.
"Há um enorme lobby para que as empresas
estrangeiras tenham mais espaço no Brasil, e um deles é a retirada da
obrigatoriedade dos 30%", afirma Ildo Sauer, professor de energia da
Universidade de São Paulo (USP) e visitante na Duke University, nos EUA.
"As multinacionais estão com dificuldade de encontrar novos recursos
favoráveis e de alta qualidade no mundo, por isso o grande interesse."
Ele explica, ainda, que a maior parte do
petróleo convencional está nas mãos de petroleiras estatais como na
Venezuela, Arábia Saudita, Irã e Iraque. O petróleo só vai subir, e o
país terá lucro nas áreas de exploração e produção, se o preço for
elevado. E, para isso, é necessário controlar o ritmo de produção. “E a
mudança proposta no regime atual não permite isso. Ela vai de encontro
ao interesse nacional."
Importância estratégica
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM)
defende a importância do pré-sal para a Petrobras - a camada representa
40% da produção total da estatal.
"Só há um objetivo: pressionar um governo
que está fraco para fazer um leilão onde a estatal não vai poder
entrar, e eles vão entrar e pagar um preço de banana. Haverá uma pressão
como nunca vimos das multinacionais para que haja leilão", frisou a
parlamentar.
Para Paulo Sotero, diretor do Instituto
Brasil do Wilson Center, em Washington, o setor energético do país tem
que ter um marco regulatório que sirva para "todas as estações". "Ou
seja: que a legislação não necessite ser modificada de acordo com a
oscilação do valor do petróleo", frisa.
Comentários
Postar um comentário