"Romper com Irã pode empurrar UE para o lado da Rússia e da China"



Ministro alemão diz que se Trump descreditar pacto nuclear com Teerã, EUA e Europa devem se distanciar. Segurança internacional seria colocada em risco, assim como negociações sobre programa atômico da Coreia do Norte.

Temendo um agravamento das condições de segurança internacionais e um distanciamento entre a Europa e os EUA, o governo alemão expressou preocupação com o possível anúncio por parte do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nesta sexta-feira (13/10) de que o Irã não está cumprindo o acordo nuclear multilateral assinado em 2015.

O ministro alemão do Exterior, Sigmar Gabriel, disse que seu país está preparado para trabalhar em conjunto com os EUA para modificar o comportamento do Irã na região, "mas não pelo preço de sacrificar o acordo nuclear".

Gabriel afirmou que o acordo foi um "grande êxito diplomático", que evitou que o Irã desenvolvesse armas nucleares e entrasse em conflito direto com Israel. "Nos preocupamos com base nos sinais que vêm dos EUA de que o presidente dirá aos parlamentares que o acordo nuclear não está sendo cumprido", disse o ministro.

"Isso vai contra a perspectiva de todas as nações europeias que participaram do acordo, assim como a da UE." "É indispensável que a Europa se mantenha unida nesta questão", disse Gabriel a grupo midiático alemão RND.

"Também temos que dizer aos americanos que seu comportamento na questão iraniana conduzirá os europeus a uma posição comum com a Rússia e a China contra os EUA."

O ministro disse ter deixado claro ao secretário de Estado americano, Rex Tillerson, que a Europa, em razão de sua relativa proximidade geográfica com o Irã, terá seus interesses na área de segurança prejudicados caso o acordo entre em colapso.

Outra questão que deve ser levada em conta, segundo Gabriel, é a influência que tal decisão poderá ter sobre futuras negociações sobre o programa nuclear da Coreia do Norte.

"Pior acordo" da história

O pronunciamento que Trump deve fazer por volta das 12h45 desta sexta-feira (13h45 em Brasília) na Casa Branca resulta de semanas de discussões entre ele e sua equipe de segurança nacional.

O presidente defende uma postura mais agressiva em relação às atividades iranianas no Oriente Médio, o que pode complicar as relações dos EUA com seus aliados europeus.

O presidente criticou repetidamente o pacto assinado em 2015 durante a presidência de seu antecessor, Barack Obama, afirmando ser este o "pior acordo" já feito pelo país. Além dos EUA e Irã, Alemanha, Reino Unido, França, Rússia, China e União Europeia (UE) também participaram das negociações. Se Trump de fato descreditar o acordo, estará ignorando alertas de dentro e fora de seu governo – além dos clamores dos parceiros internacionais – de que tal atitude deverá minar a credibilidade dos EUA no exterior.

A nova estratégia do presidente foi antecipada por vários veículos da imprensa americana. Segundo os principais jornais do país, Trump planeja eliminar a "certidão governamental" que diz que o pacto atende aos interesses nacionais dos Estados Unidos.

Trump rejeita certificar que Irã cumpre acordo nuclear

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta sexta-feira (13/10) um duro golpe contra o acordo nuclear fechado com o Irã em 2015 ao afirmar que não vai certificar ao Congresso que Teerã esteja cumprindo sua parte e que o pacto continua sendo de interesse dos EUA. A decisão, porém, não retira os Estados Unidos do acordo.

"Anuncio que não podemos e não vamos fazer essa certificação", afirmou Trump na Casa Branca, ao anunciar uma estratégia mais rígida em relação a Teerã e em desacordo com as demais potências internacionais que ajudaram a negociar o acordo.

Trump advertiu que, caso não consiga corrigir as "falhas" do acordo nuclear por meio da ação do Congresso ou de negociações internacionais, vai abandoná-lo. "Caso não alcancemos uma solução, o acordo será cancelado", disse o chefe de Estado. Ele disse que o Irã não cumpre o "espírito" do que foi acertado e cometeu "múltiplas violações".

A não certificação por parte de Trump abre caminho para a imposição de sanções ao Irã, o que pode ter um profundo impacto sobre todas as empresas que voltaram a fazer negócios com o país depois da assinatura do acordo.

Esse passo aumentaria as tensões com o Teerã e colocaria Washington numa posição delicada diante dos outros signatários do documento: Reino Unido, França, Alemanha, Rússia, China e a União Europeia.

Cabe, porém, ao Congresso americano decidir, nos próximos 60 dias, o caminho a seguir. Além de impor sanções, ele tem ainda as opções de modificar a legislação sobre o acordo ou ignorar o ato do presidente e deixar tudo como está.

No discurso, Trump anunciou ainda novas sanções ao Exército de Guardiães da Revolução Islâmica, uma divisão das forças armadas iranianas, e declarou o grupo como uma organização terrorista.

Antes do anúncio de Trump, o endurecimento da postura americana contra o Irã havia sido criticado pela comunidade internacional. Apesar das críticas, o presidente manteve esse rumo, ignorando alertas de dentro e fora de seu governo – além dos clamores dos parceiros internacionais – de que tal atitude poderia minar a credibilidade dos EUA no exterior.

Após a fala de Trump, a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, disse que os Estados Unidos não podem cancelar de forma unilateral o acordo. "Este não é um acordo bilateral", argumentou, acrescentado que o pacto "está funcionando".

"A comunidade internacional, incluindo a União Europeia, indicou claramente que o acordo está e continuará valendo", afirmou. Desde que o acordo entrou em vigor, a administração americana certifica, a cada 90 dias, perante o Congresso, que Teerã está respeitando os termos acordados e que o pacto está em conformidade com os interesses nacionais dos Estados Unidos.

Essa certificação é feita no âmbito de uma lei aprovada pelo Congresso, conhecida pela sigla Inara. O acordo nuclear entre o Irã e o grupo de países 5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU – Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China – e a Alemanha) foi alcançado em julho de 2015 em Viena, durante a administração do presidente Barack Obama.

O acordo foi assinado com o objetivo de garantir a natureza exclusivamente pacífica do programa nuclear iraniano.

Entenda o acordo nuclear com o Irã



O acordo nuclear com o Irã foi alcançado em julho de 2015, após quase 20 meses de negociações, entre o governo da República Islâmica e um grupo de potências internacionais, liderado pelos EUA. O chamado grupo P5 + 1 – cinco membros do Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha – aceitou encerrar as sanções ligadas ao programa nuclear iraniano, em troca de seu desmantelamento.

O pactom, que Donald Trump ameaça agora abandonar, entrou em vigor em outubro de 2015 e passou a ser aplicado de fato em janeiro de 2016, após a Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA) ter verificado que o programa nuclear iraniano tem fins pacíficos.

Isso levou ao levantamento, quase imediato, das sanções de países e da ONU relacionadas ao programa nuclear do Irã, incluindo as aplicadas aos setores de finanças, comércio e energia. Bilhões de dólares de bens congelados de iranianos foram liberados.

As sanções, diz o acordo, podem ser relançadas, caso o Irã viole os termos do que foi acertado. A IAEA, que monitora o pacto, repetidamente confirmou que os iranianos vêm, realmente, fazem a sua parte. O acordo permite que o Irã prossiga no desenvolvimento de seu programa nuclear para fins comerciais, médicos e industriais, em linha com os padrões internacionais de não proliferação de armas atômicas.

Detalhe importante: o pacto se aplica exclusivamente ao programa nuclear. Ele não vale para o programa de mísseis balísticos, abusos dos direitos humanos, apoio a organizações terroristas e supostas atividades de desestabilização no Oriente Médio. EUA e União Europeia (que também participou das negociações) têm diferentes sanções e restrições comerciais relacionadas a esses outros temas.

O Conselho de Segurança se ocupa da questão dos mísseis. Quando o acordo foi alcançado, há mais de dois anos, a inteligência americana estimava que o Irã estaria a três meses de produzir material físsio – capaz de sustentar uma reação em cadeia de fissão nuclear – para uma arma atômica. Mas, com o acordo, os potenciais caminhos para o Irã desenvolver uma arma nuclear foram bloqueados.

Urânio e plutônio

Um desses caminhos seria uma bomba de urânio. O Irã tem duas instalações para enriquecimento de urânio: Natanz e Fordow. Com o acordo, ficou proibido o enriquecimento de urânio em Fordow por 15 anos. Já em Natanz, o uso de centrífugas ficou limitado a 5 mil por uma década – antes do pacto, eram 20 mil.

As centrífugas permitidas são as mais antigas e menos eficientes. O Irã também aceitou, por 15 anos, reduzir suas reservas de urânio em 98%, para 300 quilos.

A quantidade não é suficiente para produzir uma única bomba atômica. Antes do acordo, estimava-se que Teerã tinha capacidade de produzir dez. Os iranianos também concordaram em limitar o enriquecimento de urânio a 3,67%, bem abaixo dos 90% necessários para uma arma nuclear.

Mais de 11 toneladas de urânio de baixo enriquecimento foram enviadas à Rússia. Outro caminho do Irã para uma bomba nuclear era através do plutônio produzido no reator nuclear de água pesada de Arak.

Com o acordo, o reator foi alterado de modo a não produzir plutônio ao nível necessário para uma arma atômica. Bastões de combustível nuclear foram enviados para fora do país.

Por 15 anos, o Irã ficou proibido de construir um reator nuclear de água pesada ou vender para outros países qualquer água pesada em excesso que não seja necessária para ser usada para fins pacíficos em Arak.

O acordo prevê um regime de monitoramento, verificação e inspeção extenso, levado a cabo pela IAEA, uma agência que presta contas às Nações Unidas. Isso permite aos inspetores identificar se o Irã está desenvolvendo armas atômicas de forma secreta.

Se suspeitar de qualquer atividade encoberta, a IAEA tem, com base no pacto, o direito de ter acesso dentro de 24 dias a qualquer lugar, incluindo instalações militares, se a maioria dos signatários estiver de acordo.

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