De uniforme camuflado, o coronel Klaus Schirra transmite informações assustadoras a jornalistas reunidos no Departamento da Polícia de Saarbrücken, no sudoeste da Alemanha: "Ontem ocorreram atentados na Baviera, em Baden-Württemberg, na Renânia do Norte-Vestfália e em Bremen, com 54 mortos e mais de 90 feridos." No próprio estado de Saarland, uma escola sofre uma ameaça de bomba – entre 302 casos semelhantes no país. Felizmente, o pesadelo descrito por Schirra é apenas um cenário de treinamento.
O objetivo do polêmico exercício de três dias: testar o trabalho conjunto entre polícia e Bundeswehr, o Exército alemão, em caso de terrorismo. O chamado Getex (sigla em alemão para Exercício Conjunto de Defesa contra o Terrorismo) é o primeiro do gênero, já que, como aponta a ministra da Defesa, Ursula Von der Leyen, "anos atrás, isso era impensável".
Impensável porque a Constituição alemã é clara: as Forças Armadas estão previstas para atuar exclusivamente contra ameaças externas. A segurança interna é garantida pela polícia. A experiência histórica ensinou os alemães que o uso de militares em situações domésticas traz riscos à democracia e à liberdade. Já na Revolução Alemã de 1848 houve envolvimento do Exército prussiano. É atribuído ao então general Gustav Von Griesheim o ditado de que "contra democratas servem apenas soldados".
Após o fim da Primeira Guerra Mundial, durante a República de Weimar, os militares foram mais uma vez voltados contra o próprio povo, mais especificamente contra comitês de trabalhadores e camponeses e outros "inimigos do regime".
Limites constitucionais
Justamente devido a tais experiências históricas, a Constituição alemã só permite a utilização do Exército dentro do país em situações muito específicas, como em "acidentes particularmente graves", conforme o artigo 35. Até o momento, na prática, isso foi aplicado apenas no caso de catástrofes naturais, como enchentes.
Em 2012, no entanto, o Tribunal Constitucional Federal ampliou consideravelmente o artigo 35, aponta o especialista em lei constitucional Joachim Wieland.
"Foi determinado que um acidente grave também pode ser causado intencionalmente – ou seja, quando terroristas provocam um atentado. O apoio do Exército é então permitido não apenas após os danos, mas já em antecipação, como prevenção dos mesmos", disse Wieland em entrevista à DW. Assim, o Getex foi viabilizado juridicamente.
Na mira dos jihadistas
Atualmente, a Alemanha, assim como a Europa, é alvo do terrorismo islâmico. Os atentados em Paris, Bruxelas e no mercado natalino da Breitscheidplatz, em Berlim, são uma evidência angustiante disso.
Na semana passada, o presidente do Departamento de Proteção à Constituição da Alemanha (BfV), Hans-Georg Maassen, disse que o "Estado Islâmico" (EI) "claramente priorizou" a Alemanha como alvo de ataques. Segundo Maassen, o potencial terrorista-islâmico no país chega a 1.600 pessoas. O número é quase três vezes maior do que os cerca de 560 ditos "perigosos" conhecidos da polícia.
Diante da atual situação de ameaça, elevada há anos para a categoria "grave", não surpreende que, numa enquete realizada em agosto passado, 72% dos entrevistados tenham dito apoiar a utilização do Exército em solo nacional para combater o terrorismo.
Momento histórico
O secretário do Interior de Saarland, Klaus Bouillon, ele mesmo um oficial de reserva, mal podia esconder sua empolgação no lançamento do Getex. "Décadas de discussões, em parte de duros confrontos, terminaram", afirmou Bouillon, que qualificou o exercício de "histórico".
"Há muita coisa que precisamos aprender no trabalho conjunto de cooperação se quisermos manter o controle numa grande situação de terrorismo", ressaltou a ministra da Defesa.
A governadora do Estado, Annegret Kramp-Karrenbauer, também se manifestou: "Terroristas trabalham em conjunto e não conhecem fronteiras. É por isso que os órgãos de segurança têm de atuar em conjunto melhor do que o fizeram no passado."
Policiais de seis estados participaram do Getex, além da Polícia Federal e da Bundeswehr. No treinamento, soldados e policiais não eram vistos nas ruas – apenas no evento organizado para jornalistas como encenação para as câmeras. O Getex foi criado com o objetivo de testar canais de comunicação entre os serviços de emergência e as centrais de operação, e tornar conhecidas as estruturas disponíveis.
Além da capacidade da polícia
Em caso de ataques simultâneos, apesar dos cerca de 300.000 policiais disponíveis em todo o país e de equipes da SWAT em cada província, os recursos da polícia não seriam suficientes. O Exército precisaria entrar em ação com suas habilidades especiais.
Para os militares, salientou Von der Leyen, casos de "terror e atentados terroristas em missões estrangeiras são infelizmente o pão de cada dia". Ela destacou que os soldados têm experiência com materiais explosivos e ferimentos provocados por incêndios e tiros. "Todas essas experiências são muito valiosas", disse.
Na simulação em Saarland, por exemplo, a polícia necessitava de um veículo blindado do Exército. "Seria impensável para nós se a polícia de Saarland tivesse que prender um agressor que ameaçasse se explodir", disse a ministra, lembrando que a vida deles também estaria em jogo. "Os veículos blindados do Exército estariam no quartel ao lado e não poderiam ser usados. "Crucial é que a polícia tenha sempre o poder de decisão", enfatizou.
O Getex foi preparado ao longo de meio ano, período durante o qual oficiais da polícia e das Forças Armadas já puderam se conhecer melhor. Para o ministro do Interior, Thomas de Maizière, o Getex mostrou que a cooperação e a comunicação entre os governos federal e estadual e entre polícia e Bundeswehr pode funcionar bem. Para ele, mais exercícios semelhantes são necessários no futuro.
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