Um a um, peritos em redes sociais do EI são mortos como parte de programa do FBI


No verão de 2015, drones armados que sobrevoavam a região leste da Síria seguiram Junaid Hussain, um influente hacker e recrutador do Estado Islâmico (EI).
Durante semanas, Hussain tomou o cuidado de manter seu jovem filho adotivo ao seu lado, por isso os drones não dispararam. Mas em certa noite, já avançada, Hussain saiu sozinho de um internet-café e minutos depois um míssil Hellfire o matou enquanto caminhava entre dois prédios em Raqqa, na Síria, a capital de fato do EI.
 
Hussain, 21, natural de Birmingham (Reino Unido), era um dos líderes de um bando de especialistas em computador que falam inglês e deram um longo alcance à propaganda do EI, incentivando seus seguidores online a cometer atentados no Ocidente. Forças americanas e aliadas mataram um a um os mais importantes dos cerca de 12 membros da célula que o FBI chama de "Legião".
Essa campanha secreta silenciou de modo geral uma voz poderosa que causou uma grande atividade de contraterrorismo nos EUA em 2015, enquanto jovens de ambos os sexos sofreram a influência de sua propaganda.
Autoridades militares, de inteligência e policiais dos EUA admitem que o EI ainda tem um sofisticado ramo nas redes sociais que poderá inspirar ataques como os de San Bernardino, na Califórnia, e Orlando, na Flórida, e continua sendo um inimigo poderoso, suspeito de manter células clandestinas na Europa. Mas elas indicam o esforço coordenado contra a Legião como prova do sucesso dos EUA em reduzir a capacidade do EI de dirigir, possibilitar ou inspirar ataques contra o Ocidente.
Inicialmente, a ameaça representada pela Legião foi vista basicamente como um problema da polícia. Conforme a ameaça se agravou, no ano passado, e o FBI intensificou o monitoramento de suspeitos de terrorismo em todo o país, o órgão pressionou os militares para que se concentrassem no grupo, segundo autoridades americanas.
Enquanto forças dos EUA e do Reino Unido conduziam uma série de ataques de drones contra membros do grupo, o FBI verificava milhares de seguidores da Legião nas redes sociais para descobrir quem havia realmente sido inspirado a entrar em ação. Nos últimos dois anos, a agência prendeu quase cem pessoas em casos envolvendo o grupo terrorista.
Várias das prisões foram de indivíduos que tiveram contato direto com a Legião. Muitos outros eram "pessoas que apareceram no nosso radar porque tomamos consciência delas" devido a suas conexões com Hussain e Reayyad Khan, outro britânico que era líder do grupo, segundo Andrew McCabe, vice-diretor do FBI.
Hussain tinha diferentes funções, incluindo a de hacker. Ele foi ligado à divulgação de informações pessoais de mais de 1.300 militares e funcionários do governo americano. Em março de 2015, seu grupo postou os nomes e endereços desses funcionários com a instrução: "Matem-nos em sua própria terra, decapitem-nos em suas próprias casas, esfaqueiem-nos enquanto caminham pela rua pensando estar em segurança".
Mais importantes foram os esforços de Hussain como recrutador online.
Segundo registros judiciais, ele se comunicava com pelo menos quatro homens em quatro Estados, implorando que eles lançassem ataques ou ajudassem a disseminar a mensagem do EI. Hussain esteve por trás de um complô para decapitar Pamela Geller, autora de um blog conservador. No início de 2015, Hussain começou a se comunicar com Usaamah Abdullah Rahim, 26, e lhe deu instruções para matar Geller.
Rahim subitamente abandonou o plano e decidiu matar um policial na área de Boston. O FBI o estava monitorando e Rahim foi morto a tiros em junho de 2015, depois de enfrentar com uma faca uma equipe de vigilância do FBI. O departamento também prendeu dois sócios de Rahim, que, segundo a promotoria, estavam envolvidos no complô.
Os parceiros de Rahim também estavam ocupados. Outro britânico, Raphael Hostey, mantinha contato com Mohammed Hamzah Khan, 19, de Bolingbrook, Illinois, que tentou viajar à Síria com seus dois irmãos menores antes de ser preso pelo FBI.
Em outra trama que o FBI desvendou, Hussain instruiu um estudante de faculdade de Ohio chamado Munir Abdulkader para sequestrar um militar e gravar seu assassinato em vídeo. Então Hussain pediu que Abdulkader atacasse uma delegacia na área de Cincinnati. Enquanto Abdulkader se preparava para a operação suicida, ele contou a Hussain sobre sua proeza na raia de tiro.
Hussain respondeu: "Na próxima vez você deve atirar nos 'kuffar' na cara e na barriga". "Kuffar" é um termo depreciativo para os não muçulmanos.
Abdulkader, 21, que nasceu na Eritreia, foi preso e se confessou culpado em julho de apoio material ao terrorismo e de planejar matar um membro dos militares e policiais. Foi condenado a 20 anos de prisão.
E no ano passado o FBI prendeu um homem da Carolina do Norte, Justin Nolan Sullivan, então com 19 anos, e o acusou de tentar fornecer apoio material ao EI. Os promotores federais disseram que ele planejava atacar um local público em um tiroteio em massa. As autoridades disseram que Sullivan e Hussain tinham conversado sobre fazer um vídeo do ataque para usar como propaganda.
Quando os pais de Sullivan manifestaram preocupação sobre o fato de seu filho ter comprado um silenciador para arma, ele falou a um agente disfarçado do FBI sobre matá-los. Sullivan, que descreveu Hussain como parte do "cibertime" do EI, também foi acusado de matar seu vizinho de 74 anos com um tiro na cabeça.
Uma autoridade policial graduada dos EUA descreveu a primavera e o verão de 2015 como um "pesadelo" para o FBI. Um surto de atividade terrorista deixou o órgão atordoado. A tensão foi tão grande, segundo o diretor do FBI, James Comey, que o birô teve dificuldade para acompanhar o ritmo da ameaça, obrigando-o a deslocar oficiais da área criminal para esquadrões de vigilância.
Mas então, realizando um ataque após o outro, as forças americanas e britânicas se empenharam em destruir a Legião. Hostey foi declarado morto em maio passado. Vários meses depois, Reyaad Khan foi morto em um ataque de drone.
O australiano Neil Prakash foi visado em um ataque mais ou menos na mesma época. Uma autoridade americana disse que Prakash foi ferido, mas sobreviveu. Nas últimas semanas, porém, um governo do Oriente Médio prendeu Prakash, segundo outro militar graduado americano.
Hussain morreu em agosto de 2015. Sua mulher, Sally Jones, uma ex-musicista de rock punk do sudeste da Inglaterra, que foi com ele para Raqqa, estaria viva. Shawn Parson, que era de Trinidad-Tobago e fazia parte do círculo de Hussain, também foi morto.
Autoridades dos EUA dizem que ficaram surpresas que o EI não tenha substituído Hussain e os outros membros da Legião por hackers de capacidade comparável. Mas o FBI continua lutando com o legado de Hussain.
"Ainda estamos lidando com as repercussões daqueles fatos e o recrutamento daquela rede até hoje", disse o oficial McCabe, do FBI.

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