Merkel a Erdogan: "Pena de morte é incompatível com UE"







Em telefonema com presidente turco, chanceler federal alemã afirma que reintrodução da pena capital por Ancara seria rejeitada pelo bloco europeu e impediria uma possível adesão da Turquia ao bloco.

A Turquia jamais ingressará na União Europeia (UE) se reintroduzir a pena de morte do país, disse a chanceler federal alemã, Angela Merkel, ao presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, em conversa por telefone nesta segunda-feira (18/07), afirmou uma porta-voz do governo alemão.
Ancara aboliu a pena capital em 2004, permitindo que fossem iniciadas, no ano seguinte, negociações sobre sua adesão ao bloco europeu. Porém, elas avançaram muito pouco desde então.
Após a tentativa de golpe de Estado realizada por um grupo de militares na última sexta-feira, manifestantes pró-governo passaram a exigir a execução dos líderes da rebelião. Diante disso, no domingo, Erdogan declarou que o governo discutirá a reintrodução da pena de morte no país.
Segundo a porta-voz, Merkel disse que a pena de morte "não é de nenhuma forma compatível" com a meta de adesão à UE.
"A chanceler clamou ao presidente por respeito aos princípios de proporcionalidade e do Estado de Direito na resposta do governo turco à tentativa de golpe", disse o porta-voz.
Merkel ainda expressou "uma séria preocupação" sobre a onda de prisões e demissões entre militares e funcionários públicos, incluindo policiais. Os últimos números divulgados falam em mais de 7,5 mil detidos, entre eles 6 mil militares, além de quase 9 mil funcionários públicos demitidos.
Os comentários de Merkel foram seguidos por declarações do ministro alemão do Exterior, Frank-Walter Steinmeier, que disse a repórteres em Bruxelas que a Alemanha espera que a Turquia lide com os responsáveis pela tentativa de golpe levando em conta o Estado de Direito.
"A reintrodução da pena de morte impediria o sucesso das negociações de adesão da Turquia à União Europeia", reiterou o ministro.
Além dos políticos alemães, outros líderes europeus exigiram nesta segunda-feira que as instituições democráticas e o Estado de Direito sejam respeitados pelo governo da Turquia.
"Nós estamos dizemos que o Estado de Direito deve ser protegido no país, não há desculpas para qualquer medida que afaste o país disso", afirmou a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, antes do início de uma reunião dos ministros do Exterior da União Europeia (UE) em Bruxelas.
Acordo sobre crise migratória
Mais cedo nesta segunda-feira, o porta-voz de Merkel, Steffen Seibert, afirmou que a tentativa de golpe na Turquia e suas consequências não colocam em risco os acordos entre a UE e Ancara sobre refugiados. "Os dois são assuntos distintos", disse Seibert.
A Turquia e o bloco econômico chegaram a um acordo em março deste ano, no qual Bruxelas prometeu repassar 6 bilhões de euros a Ancara ao longo dos próximos três anos, a fim de melhorar a vida dos cerca de 3 milhões de refugiados no país e conter o fluxo migratório para a Europa.
"A Turquia se comprometeu a implementar o acordo sobre a crise migratória antes da tentativa de golpe, e não houve qualquer indicação nas discussões que tivemos no fim de semana de que alguma coisa mudou quanto a essa posição", disse um porta-voz do Ministério do Exterior alemão.

Ex-comandante turco nega participação em tentativa de golpe

O ex-comandante da Força Aérea turca Akin Öztürk, suspeito de ser o líder da tentativa de derrubar o governo na última sexta-feira, negou sua participação no golpe fracassado, informaram nesta segunda-feira (18/07) a agência de notícias estatal turca Anadolu e a emissora NTV.
"Não sou a pessoa que liderou o golpe de 15 de julho de 2016. Não sei quem planejou ou conduziu esse golpe", disse o militar, comandante da Força Aérea até agosto do ano passado, segundo os veículos.
A informação contradiz o que a Anadolu havia noticiado mais cedo, afirmando que Öztürk tinha confessado sua participação ao declarar ter "agido com intenções de promover um golpe de Estado". A agência logo corrigiu a informação.
Uma cópia da declaração de Öztürk a promotores foi obtida por veículos de imprensa privados, que a publicaram em seus sites. Nesta, Öztürk negava categoricamente sua participação no golpe.
"Com base nas minhas experiências, acredito que a estrutura paralela [do clérigo islâmico Fethullah Gülen] levou adiante esse golpe militar. Mas não posso dizer quem organizou ou levou adiante essa questão dentro das forças de combate turcas. No que diz respeito a isso não sei nada. Lutei muito contra essa estrutura [de Gülen]", disse o ex-comandante.
Öztürk, detido no sábado, foi levado nesta segunda-feira ao tribunal em Ancara junto a outros 20 generais sob pedido de prisão preventiva. Fotos publicadas pela mesma agência de notícias mostram diversos ferimentos na parte superior do corpo do general, incluindo a cabeça.
No domingo, a imprensa turca começou a especular que Öztürk era cotado para ser o novo chefe do Estado-maior caso a tentativa de golpe tivesse êxito.
Segundo a Anadolu, ele é um dos 112 generais e almirantes das Forças Armadas detidos pelas forças turcas – o número representa quase um terço dos 356 generais e almirantes que compõem o órgão.
Os militares estão sendo acusados de "conspiração a fim de alterar a ordem constitucional pela força", "resistência armada contra a autoridade", "criação de uma organização armada" e, em alguns casos, de "conspiração e realização de um ataque contra o presidente".
Milhares de detidos
Mais de 7,5 mil pessoas foram detidas desde sexta-feira, entre elas mais de 6 mil militares, de acordo com os últimos dados divulgados pelo primeiro-ministro da Turquia, Binali Yildirim.
Além disso, desde a tentativa de golpe, 8.777 funcionários públicos foram removidos de seus cargos na Turquia. Entre eles há trinta dirigentes políticos – sendo um governador e 29 prefeitos –, 50 funcionários do alto escalão do governo de Recep Tayyip Erdogan, e 7.899 policiais.
A tentativa de derrubar o governo turco na noite da última sexta-feira resultou na morte de mais de 290 pessoas, entre as quais mais de cem golpistas.
Nesta segunda-feira, depois das notícias das milhares de detenções, líderes europeus exigiram que as instituições democráticas e o Estado de Direito sejam respeitados pelo governo da Turquia.
"Nós estamos dizemos que o Estado de Direito deve ser protegido no país, não há desculpas para qualquer medida que afaste o país disso", afirmou a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, antes do início de uma reunião dos ministros do Exterior da União Europeia (UE) em Bruxelas.

Cresce medo de repressão na Turquia após golpe fracassado

Após 36 anos, a Turquia foi palco de mais uma tentativa de golpe militar. Mesmo fracassada, ela deixou muitas perguntas sem resposta, principalmente após tantas detenções. Na noite do levante, orações fúnebres foram transmitidas dos minaretes das mesquitas em toda Turquia.
"Enquanto bombas eram jogadas por aviões de guerra, tentávamos, em primeiro lugar, manter o moral das pessoas elevado. Mais tarde, lemos orações fúnebres para nossos mártires da democracia", explica Mehmet Görmez, chefe do Diretório de Assuntos Religiosos.
Isso pode abrir caminho para uma perigosa onda de radicalismo, segundo a professora de Ciências Políticas Ayse Ayata da Universidade Técnica do Oriente Médio, de Ancara. "A leitura de orações fúnebres em mesquitas abre o caminho para o radicalismo, absorvendo a política pela religião. Essa situação aumenta o risco de criar alienação entre as pessoas e segregação", diz Ayata.
Liberdade de imprensa
Além de uma sociedade cada vez mais polarizada, proteger a liberdade de expressão continua a ser uma preocupação séria. A CNN e o canal estatal TRT foram invadidos pelos golpistas, e uma série de portais de notícias da oposição foram bloqueados pelo governo.
"Tenho medo de que medidas duras afetem a imprensa e os jornalistas, usando a desculpa do golpe", disse Ahmet Abakay da Associação dos Jornalistas Modernos (CGD), que publicou um texto declarando que a entidade se opõe tanto à tentativa de golpe como às leis de estilo autoritário. A CGD enfatizou que uma imprensa livre é uma garantia de democracia e instou o governo a parar de colocar pressão sobre os jornalistas.
"A imprensa não é responsável pelo que aconteceu. E está aqui para garantir a sobrevivência da democracia. O governo deve se abster de aterrorizar a imprensa e deve abandonar seus esforços para criar uma única voz", pede Abakay.
Expurgo militar
Imediatamente após a tentativa de golpe, que o governo classificou de levante praticado por um grupo dentro das Forças Armadas da Turquia (TSK), foi lançada uma grande operação de expurgo no meio militar. Um em cada cinco generais foi levado sob custódia ou formalmente preso, sob acusação de violar a Constituição e tentar derrubar o governo.
"Temos de condenar os ataques contra pessoas inocentes da mesma maneira que condenamos a tentativa de golpe", salienta o militar aposentado e especialista em segurança Atilla Sandikli.
"O público não quer violência. O esforço para se criar a percepção de que a tentativa de golpe foi apoiada por todo o Exército turco deve ser posto de lado", reclama Sandikli, acrescentando que a noção de uma vitória do povo contra uma tentativa de golpe não deve se transformar na noção de que o povo e os militares estão em lados opostos. "Insinuar que os militares turcos são a favor do golpe não só prejudicaria os militares, mas também a democracia turca", avalia.
Limpeza do Judiciário
Após a tentativa de golpe fracassada, outro expurgo grave ocorreu dentro do Judiciário, resultando na remoção de milhares de juízes de suas posições. Mandados de prisão também foram emitidos para muitos deles.
"Se a tentativa de golpe tivesse sido bem-sucedida, eles teriam suspendido a ordem jurídica", argumenta o presidente da Federação das Ordens de Advogados da Turquia (TBB), Metin Feyzioglu.
"Somos obrigados a ficar juntos para garantir que isso não aconteça. Todo mundo deve ter garantido o direito a um julgamento justo. Recorrer à mentalidade de que 'eles iriam fazer isso conosco' não está certo", afirma. "Nós, das 79 ordens de advogados, somos contra a tentativa de golpe, tanto quanto somos contra a suspensão da ordem jurídica."
Pena de morte
A revolta fracassada de 15 de julho chocou a Turquia. Manifestações antigolpe estiveram repletas de slogans pedindo a pena de morte para os orquestradores do levante. O presidente Recep Tayyip Erdogan respondeu ao apelo dizendo que todos os pedidos devem ser considerados numa sociedade democrática e que a questão deve ser avaliada pelo Parlamento.
A Turquia aboliu a pena de morte em 2004, como parte dos esforços para adesão à UE. A última vez que elafoi aplicada foi em 1984. Como membro do Conselho da Europa, a Turquia está vinculada a seus compromissos no âmbito da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e, por isso, aboliu a pena capital. Se o governo turco quiser reintroduzi-la, terá que aprovar uma emenda constitucional.
A questão poderia ser levada a referendo com 330 votos, ou poderia ser aprovada com 367 votos, de acordo com o cientista político Ersin Kalaycioglu.
"Com os números atuais no Parlamento, se tal mudança constitucional for apoiada pelo governista Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) e pelo oposicionista Partido do Movimento Nacionalista (MHP), mas for rejeitada pela principal legenda da oposição, Partido Popular Republicano (CHP), e pelo pró-curdo Partido Democrático dos Povos (HDP), podemos dizer que isso não seria matematicamente possível", sublinha Kalaycioglu. "Mas se for a referendo, e as pessoas disserem sim à pena de morte, isso poderia abrir caminho para uma mudança política bastante severa."

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